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sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Carta ao amigo que se suicidou.

Quisera dar-te, amigo, todas as coragens que me tornaram ousado quando conquistei a mulher amada. Dar-te-ia também os medos que frearam a ensandecida ladeira da minha irresponsabilidade juvenil. Cortaria um pedaço do coração para transplantar para teu peito a felicidade do primeiro beijo que desvirginou os meus lábios. Eu também te convidaria para pedalar ao meu lado até a mangueira grande e discreta, onde, solitário, confidenciei em solilóquios intermináveis, alguns sonhos impossíveis.

Quisera dar-te, amigo, todos os questionamentos e descobertas que já fiz sobre o mistério de Deus. Eu te convidaria a assistir ao meu primeiro rasgo de conversão. E como, hesitante, desejei a verdade, a mesma verdade que insiste em distanciar-se de mim sempre que imagino tê-la em meus braços. Eu te faria parceiro da minha Primeira Comunhão católica em Londrina; chamaria para presenciar a noite da Profissão de Fé presbiteriana; convidaria para o culto de oração onde recebi o Batismo no Espírito Santo pentecostal; conversaria, inclusive, sobre a minha recente abertura para a espiritualidade existencial. Eu quisera ensinar-te que a jornada em direção ao Divino não é sempre ascendente, mas repleta de altos e baixos. Repartiria assim meus entusiasmos e tristezas para trançarmos nossa amizade como uma corda de muitos fios.

Quisera dar-te, amigo, os instantes magros em que não contabilizei fracassos, só encarei o dever de perseverar. As esperanças idealizadas não pareciam quixotismo. Os projetos faraônicos se mostravam perfeitamente alcançáveis. Tapei enormes buracos com minha ingênua boa vontade; relevei decepções, convencido que não passavam de mal-entendidos. Presentear-te com desapontamentos seria meu jeito de pedir: não desista. Não vire o tablado do jogo. A vida é assim; os homens não são sempre confiáveis, Deus sim.

Quisera dar-te, amigo, meu ouvido discreto, meu olhar atento, meu abraço silencioso. Sinto o ímpeto de colocar-me na trajetória da bala, na frente do trem, no olho do furacão, no meio do terremoto. Para poupar-te, estaria disposto a ser antídoto, escudo, parapeito, bóia, escada, pára-quedas. Faria qualquer coisa: massagem cardíaca, respiração boca a boca, transfusão de sangue. Podias fazer de mim psicanalista, confessor, saco de pancada. Não te condenaria. Não te cobraria. Não te rejeitaria, contanto que disseses que não jogaria a toalha.

Amigo, saber que segastes a vida por conta própria foi o golpe mais duro que já levei. E eu, que não te conhecia tão bem, acordei desolado neste mundo árido. Carregarei a sensação de que poderia ter sido o amigo mais achegado que um irmão. Não fui. E todos perdemos. Mas ao contrário de ti, não vou desistir, sei que ainda posso ser amigo de outro.

(Faz pouco tempo; ainda dói)


postado pelo Pastor R.G

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